Como os pais podem ajudar na escolha da profissão dos filhos?

28 de dezembro de 2020

Matheus Borré
Professor de Física, especialista em educação moderna e fascinado pelo potencial transformador da aprendizagem sobre nossas vidas. Publicado em . | Atualizado em 28 de dezembro de 2020.
O que você quer ser quando crescer? Essa inocente pergunta abre espaço para uma importante reflexão: qual profissão melhor representa a figura de adulto que a criança quer ter quando crescer? Cabe aos mais velhos – pais, responsáveis ou outras influências – o trabalho de orientá-la durante esse processo de escolha da profissão.
Pode não ser uma influência explícita, daquelas em que há um diálogo claro sobre o futuro, mas a pessoa que a criança escolhe como exemplo entrega, continuamente, informações para que a decisão sobre o seu futuro seja feita, e há diversos parâmetros observados por ela. Poder de consumo, influência social e histórico de fortalecimento da profissão são alguns deles.
Dentro do leque de futuros observáveis, podemos citar as profissões tradicionais, como a advocacia, a medicina e a engenharia. Todas possuem raízes profundas que representam alto poder de compra, influência sobre pessoas e sociedade e o status do título que as acompanha, por isso, são respostas recorrentes à pergunta inicial que crianças um pouco mais maduras tendem a apontar.
Nos concentremos, contudo, nas profissões que não se encontram nessa trinca: os astronautas, pilotos de corrida, cozinheiros e youtubers, por exemplo. O que elas têm em comum? A demonstração das vontades pessoais daqueles que as escolhem.
Há inúmeras outras profissões que, tal como as citadas, descrevem futuros que se adequam aos gostos e aos desejos daqueles que as escolhem. Os astronautas refletem, entre outras coisas, o ímpeto às descobertas, à ultrapassagem dos limites. Dos pilotos de corrida, destacamos a adrenalina causada pela ação. Dos cozinheiros, o amor à comida que cria memórias. Há algo a ser observado em cada uma delas.
Dos youtubers, você pode estar pensando. Bem, youtubers, Tik tokers e demais influenciadores modernos merecem um parágrafo à parte para ser discutido. Essas profissões são retratos de uma sociedade que não opera sobre os mesmos parâmetros nos quais se fortaleceram as profissões tradicionais, como a medicina, a advocacia e a engenharia. Podemos observar que o aparecimento dessas novas funções não é passageiro, mas um indício de abertura do espaço de trabalho a profissões que os mais velhos, por vezes, não compreendem.
Vejamos aquelas relacionadas à tecnologia digital. Atualmente, ao criar uma empresa, as ações de marketing são primariamente voltadas ao ambiente digital. O ecossistema que as mídias sociais construíram propiciou o surgimento de profissões relacionadas ao marketing digital, marketing de conteúdo e gestão de mídias. Empresas de tecnologia se formam ao redor de desenvolvedores back end, front end, UX e demais funções do meio tecnológico.
O site itforum, focado em discussões sobre as tecnologias digitais, destaca 5 profissões que aos poucos foram surgindo nesta década de rápidos avanços e ficaram em evidência em 2020, 3 delas diretamente relacionadas à gerência e criação de ferramentas tecnológicas digitais. Já pela revista Exame, de 96 profissões do futuro divulgadas pelo Fórum Econômico Mundial, 35 são diretamente relacionadas à ciência e engenharia de dados ou à gestão de uma empresa digital.
Há algo que podemos refletir sobre a nova sociedade que se mobiliza ao nosso redor. Zygmunt Bauman, filósofo e sociólogo polonês, descreve a sociedade atual como sendo uma “sociedade de consumidores”. Uma das características dessa sociedade é a inversão no seu padrão de consumo: de intensos criadores de produtos concretos a consumidores de experiências.
Mais valem as memórias criadas durante o percurso do que o ponto de chegada. Essa informação diz muito sobre as profissões atuais e futuras. O período de tempo em que o usuário permanece nos ambientes digitais disponíveis são o novo petróleo. Os prazeres pessoais passam a migrar gradualmente das grandes compras para as fortes experiências. A compra de um carro já não oferece mais a mesma sensação de liberdade que outrora oferecia.
Então, o que um pai ou responsável pode fazer para auxiliar um filho durante esse processo de escolha da profissão – que é um processo de reconhecimento e não apenas uma decisão – tão essencial para a vida de alguém?
Primeiramente, deve-se ter em mente a necessidade de uma sensibilidade que nos permite perceber o mundo de forma mais profunda. Observar que as definições resumidas do que fazem os cozinheiros, por exemplo, não refletem todas as habilidades exigidas para tal. Há muito cálculo, logística e estatística no gerenciamento de um restaurante, bem como há muito conhecimento sobre comunicação e produção audiovisual em youtubers com milhões de seguidores na internet. O ponto principal é que a criança deve ter a oportunidade de observar as profissões segundo as suas impressões pessoais para que, assim, ela aproxime seus reais desejos à ideia de futuro que melhor a representará.
Ficou claro o intenso remodelamento das estruturas sociais e comerciais no século em que vivemos. Supor que nossas impressões em 2020 sejam as mesmas daqui a uma ou duas décadas é negar as características que vemos hoje. Na verdade, tendemos a uma maior fluidez e agilidade nas mudanças econômicas mundiais. Deixar que o mundo oriente as crianças sobre o futuro é colocá-las à deriva em um mar repleto de diferentes correntes entrelaçadas entre si.
O objetivo é que a escolha da profissão não seja feita a partir daquilo que o mundo deseja dela, mas daquilo que ela deseja do mundo.
Há espaço para inovações, assim como há espaço para o tradicional, desde que, no final, representem as vontades sinceras. Dessa forma, pais e responsáveis, não queiram que seus filhos sejam hábeis em ler apenas o mundo e o que podem fazer por ele, mas que sejam profundos conhecedores de si mesmos e que, assim, sejam eles os responsáveis em propor as mudanças.
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